Ao longo do desenvolvimento desta história em quadrinhos, tive um período bem desafiador de buscar mudar o meu desenho. Eu venho de uma tradição de desenho muito realista, muito detalhista, em que o principal era desenhar (e pintar) exatamente o que eu estava vendo ou criando, e que usei durante quase todo o tempo em que trabalhei como desenhista para o mercado franco-belga. Para alguns exemplos, ver aqui, aqui e aqui.
Tudo começou quando quis fazer uma história minha, própria. Eu havia terminado meus projetos para a gringa e tinha uma liberdade quase total nas mãos – que era, afinal, o que eu buscava –, mas me libertar do velho estilo de desenho com suas exigências e rigor não foi nada fácil. Eu queria criar algo novo, mas comecei desenhando como sabia, então o resultado final sempre ficava um tanto “realista” demais, um tanto “parado” demais, um tanto… “perfeito” demais.
A pressão por fazer tudo perfeito e detalhado quase me paralisou. A exigência do tipo de desenho que eu fazia antes não permitia mais que o traço fluísse. E aí eu me vi numa situação de não conseguir desenhar como antes e também não saber o que fazer de novo! Acho que foi nesse momento que comecei a experimentar com nanquim – vejam bem, antes eu fazia a arte-final com o lápis mesmo, sendo os esboços feitos com grafite azul –, coisa que há anos não fazia. Depois de muito quebrar a cabeça, comecei a usar o material de nanquim que mais se assemelhava ao lápis pois me permitia maior controle: a caneta nanquim descartável.
Rapidamente, porém, percebi que ela não iria me alçar a vôos mais altos. Eu já tinha experimentado o bico de pena antes, mas a (aparente) dificuldade de controle do traço e o “arranhar” da ponta metálica me haviam posto para correr. Ainda assim, eu queria aquele traço puro, com a tinta preta bem definida, coisa que com a caneta nanquim não conseguia obter. Então, respirei fundo e resolvi investir.
Praticar, praticar, praticar. No início eu só repetia o rigor e detalhamento que fazia antes com o lápis usando o bico de pena, mas então uma coisa interessante começou a acontecer…
O bico de pena me fez simplificar meu traço. Como ele não se presta às nuances de grafite que eu fazia antes, e todas as linhas são super definidas, com a prática passei a me adaptar melhor às condições que essa ferramenta oferecia, não só simplificando mas deixando mais dinâmico o meu desenho. Os resultados estão aí:
Ou seja, o bico de pena me ensinou a trabalhar mais solta, mais simples, com mais estilo. E o estilo que se desenvolveu é o que uso até hoje. A partir daí, consegui fazer novamente que o meu trabalho “fluísse” sem a tensão de antes, e pude explorar melhores e mais possibilidades gráficas que antes sequer desconfiava.
Mas, sobretudo, a prática e o direcionamento novo de buscar uma expressão própria foram fundamentais. A nova ferramenta ajudou, é claro, e notei que quando fui trabalhar com arte-final com pincel o “jeito” do pincei também influenciou o meu traço. Hoje trabalho com um e com outro, mas o bico de pena prevalece no desenho enquanto que o pincel é a ferramenta com que já gosto de fazer todo o desenho quando trabalho com pintura.
Então, se você quer ou está buscando um estilo novo, o conselho é o de sempre: pratique, pratique, pratique. Tente usar um material diferente. Busque referências de estilos que vocês curtem e que inspiram vocês. Mas preencham vários sketchbooks que ele aparece. 😉
Ana,
Seu traço, sinceramente, me deixa besta. Já era lindo na versão “certinha”, mas hoje, elástico e atrevido sem perder o detalhismo, ele chegou a um grau de expressividade deslumbrante. E olha que já vi ilustração de muita gente, de tudo quanto é lugar do mundo. Não falo por falar. Há tempos que sou sua fã. Espero um dia poder encomendar uma arte comissionada sua.
Querida, muitíssimo obrigada! Me deixas incrivelmente feliz com essas palavras tão gentis! Nem sempre é fácil continuar, mas com um incentivo desses a força se restaura. Te faço uma arte com todo o prazer. Beijo grande! <3
Parabéns pelo conteúdo deste blog, fez um ótimo
trabalho!
Gostei muito.
um grande abraço!!!