A nota do Correio do Povo sobre a rua Castro Alves, num dos mais tradicionais territórios negros de Porto Alegre do início do século XX, expõe um problema que se repete nas cidades brasileiras até hoje: a precariedade dos bairros mais pobres e afastados. Enquanto o centro da cidade recebia novas luminárias, grandes avenidas concretadas e abundantes meios de transporte, bairros distantes como a antiga Colônia Africana permaneciam desassistidos:
“É deplorável a situação da rua Castro Alves, na Colonia Africana[1]
A municipalidade, ao que parece, desconhece a existência daquelle abandonado trecho da cidade
Não existissem os clichés acima e talvez esta reclamação não fosse publicada.
Não ha secção de jornal mais difícil de ser diariamente preenchida do que a que encerra as reclamações constantes e justas das populações dos nossos arrabaldes.
Todos os recantos da cidade estão cheios de atoleiros perigosos, onde, seguidamente, se verificam accidentes de toda sorte.
Todos os arrabaldes, ao lado das excelentes faixas de cimento, possuem inexgottaveis depósitos de pedras soltas.
Todos eles são pessimamente iluminados.
Nenhum possue serviços sanitários.
Desconhecem limpeza.
São mal servidos de meios de transportes.
Todos os dias trasladamos para estas columnas um punhado de reclamações que nos são trazidas, não raro por gente pobre, que vem a pé á cidade, somente para trazer até nós a sua supplica.
As nossas fotografias representam trechos da rua Castro Alves, na antiga Colonia Africana, hoje Bairro Rio Branco.
Ambas são sugestivas e dispensam maiores detalhes. Por ellas se póde aquilatar a penosa situação dos moradores daquella rua, presos em suas casas nos dias chuvosos e com os pés em péssimas condições, se faz bom tempo.
A municipalidade muito tem feito, não ha negar, pelo centro urbano da cidade.
Quanto aos arrabaldes, como mel em bocca de creança, sómente ganharam as faixas de cimento muito necessárias, sem duvida alguma, mas que é incluída no imposto a pagar pelos proprietários da zona.
Já é tempo dos pontos de moradia mais barata e accessiveis á bolsa do pobre desfructarem um pouco de conforto e hygiene.
É o que pedem os moradores da rua Castro Alves, que, confiantes, aguardam a próxima visita dos operários municipaes, munidos das respectivas enxadas, pás e picaretas”.
Autoria desconhecida.
Referências:
[1] Correio do Povo, 18/09/1930, p. 12. Hemeroteca do Arquivo Histórico Municipal Moysés Vellinho. A grafia original foi mantida.