Se na virada do século XIX para o XX ainda hesitava-se em investir em anúncios publicitários no Brasil, nas décadas seguintes os “reclames”, como eram chamados, vieram para ficar na imprensa, nos muros da cidade e, em especial, nos transportes coletivos. Os anúncios publicitários já aproveitavam a visibilidade dada pelo grande trânsito de passageiros nos bondes, como afirma Nicolau Sevcenko:
“Não por acaso, o suporte privilegiado das primeiras campanhas publicitárias com cartazes eram as paredes internas e externas dos bondes. Enquanto as antigas caleças, landôs, ‘aranhas’ ou charretes […] eram em geral alugadas por um grupo de pessoas que se conheciam, os bondes […] introduziram a convivência de multidões de estranhos, anônimos e desconhecidos uns dos outros, além de competidores irascíveis pelo espaço e conforto limitados. A luta na refrega dos bondes era por um respeito mínimo à privacidade de cada um, mantida como última defesa naquele veículo público, e às vezes demarcada pelos próprios limites do corpo de cada um. Isolar-se na privacidade significava em geral absorver-se no silêncio das próprias reflexões ou, na falta delas, do mero tédio. Era dessa disponibilidade da imaginação que a publicidade carecia, captando-a com truques sensoriais, cativando-a pelas promessas e seduzindo-a pelo desejo.”1
Da mesma forma, a empresa B. Garcia & Cia. propunha a colocação de anúncios nos trens da Viação Férrea de Porto Alegre, como assegura a matéria da revista A Máscara em 1926. A julgar pelas fotos internas dos trens, havia mesmo muitos espaços para publicidade já planejados para os cartazes, e todos eram aproveitados.
“B. Garcia & Cia. – Secção de Reclames2
Para aquelles que avaliam o valor de uma propaganda constante, uma reclame que se estenda a todos os pontos do Estado, é sem duvida na Viação Ferrea o logar preferido, onde a collocação de cartazes tanto nos carros como nas estações chama e pede a attenção pelas suas cores vistosas e figuras escolhidas.
Temos visto este systema de propaganda adoptado em todas as Estradas do Brasil. No entando preciso se torna dizer, que no nosso Estado a firma B. Garcia & Cia. concessionaria para a collocação desses annuncios, tem sabido tambem distinguir-se, neste ramo, dando uma feição mais artistica, elegante e chic, pelo cuidado que lhe merece a confecção, collocação e conservação desses annuncios.
Nos carros novos ha pouco chegados da Europa, a collocação de cartazes, reclames é verdadeiramente elegante, o que mostra o bom gosto daquelles que escolheram o typo de cartaz e tambem daquelles que ali os mandarem collocar.
Nesses carros de luxo, foi adoptado o systema de cartazes de crystal sobre cartolina pintada a aquarella, geralmente usados, hoje, nos grandes centros commerciaes do universo.
As nossas illustrações dizem mais que as nossas palavras, e os milhares de passageiros diarios em todas as linhas não deixam de notar essas placas que alegram e enfeitam os carros e estações, que tanta utilidade têm não só para os annunciantes como também para quem os lê.
Além da propaganda nos trens e estações da Viação Ferrea do Rio Grande do Sul, encarrega-se, a firma B. Garcia & Cia., da distribuição de qualquer genero de reclame nesta capital e no interior do Estado.”
A-Mascara_AnoIX_nr2_Maio-de-1926_p_B-Garcia-Seccao-de-reclames-01_w
01. Página da revista “A Máscara” com o cabeçalho “B. Garcia & Cia – Secção de Reclames. Inseridas em meio a três colunas de texto, duas imagens: acima e à direita, um desenho de anúncio publicitário da empresa B. Garcia e Cia., consistindo no desenho a nanquim de um cartaz, aparentemente à beira de uma estrada de ferro, e que aparece um trem passando sobre trilhos e, ao seu lado, cartazes de anúncios da empresa. Embaixo, uma plaqueta com o endereço e telefone da empresa. Embaixo e à esquerda, a fotografia do interior de um vagão da Viação Férrea. Vê-se a entrada, ao fundo, ladeada por dois painéis no qual estão installados vários cartazes publicitários. Mais em baixo e dos dois lados, bancos para os passageiros. O teto é levemente arqueado e possui aberturas, provavelmente para ventilação. Embaixo da fotografia, a legenda: ‘Uma demonstração da menria como são collocados os annúncios nos carros da viação Férrea’. Revista “A Mascara”, Ano IX, nº 2, Maio de 1926. Coleção Rio Grande do Sul da Biblioteca Pública do Estado.
Autoria desconhecida
Referências:
1 SEVCENKO, Nicolau. A capital irradiante: técnica, ritmos e ritos do Rio. In: História da vida privada no Brasil. Vo. 3 – República: da Belle Époque à Era do Rádio. NOVAIS, Fernando A. (coord. geral da coleção); SEVCENKO, Nicolau (org. do volume). São Paulo: Companhia das Letras, 1998. p. 551-552.
2 Revista “A Mascara”, Ano IX, nº 2, Maio de 1926. Coleção Rio Grande do Sul da Biblioteca Pública do Estado.