Prédios abandonados e em ruínas ocorrem em todas as cidades do mundo, frutos, entre outras coisas, de impasses judiciais, dificuldades de vender ou simplesmente o desinteresse dos proprietários. Mas quando ameaçam a segurança dos transeuntes – além de albergar atividades suspeitas e servirem de depósito de lixo – aí exigem as providências das autoridades municipais.
Nesta reportagem do Estado do Rio Grande de 16/01/1930, o contraste não poderia ser maior: em plena cidade que se moderniza, abre grandes avenidas iluminadas e constrói seus primeiros arranha-céus, dois pequenos prédios térreos claramente coloniais insistiam em trazer para o passado a paisagem que se projetava no futuro. Em pleno centro da cidade, um deles ainda próximo à majestosa Prefeitura, não poderiam deixar de lembrar a cidade que se queria civilizada, cosmopolita e limpa do passado colonial que ela tanto queria deixar para trás.
“Prédios em ruinas que precizam ser demolidos[1]
Para dois desses casebres voltamos a pedir providências á municipalidade e á hygiene
Diversos proprietários queixam-se contra o apedrejamento de casas desoccupadas, pelo molecório
A administração municipal de Porto Alegre parece que está de braços cruzados.
Os seus serviços não satisfazem à população e em casa recanto da cidade apparece, como indice dessa indifferença, uma innumerável série de desmantellos, que, absolutamente, não se justificam.
Bairros centraes, como o da cidade baixa, permanecem immundos e atravancados de cousas imprestaveis, como se os proprietários e moradores daquella vasta zona não tivessem, ao menos, direito á hygiene.
Na rua Demetrio Ribeiro, quadra compreendida entre a Bento Martins e Jeneral Auto, de longa data, existem duas casas se desfazendo ao tempo, uma das quaes – a de numero 628 – já não possue nem portas nem janellas.
Bem em frente a essas ruínas, fica o outro pardieiro. Sobre este, cujo cliché estampamos, hoje, novamente, já tivemos opportunidade de nos referir, chamando a attenção do director da Hygiene e da Municipalidade.
Não obstante, até agora, nenhuma providência foi ordenada, pois os citados predios continuam ameaçando a integridade physica dos transeuntes, e servindo, à noite, de cloacas publicas aos vagabundos e pessoas menos escrupulosas.
A casa nº 581, que se vê no cliché, não tem mais tecto. As telhas e as vigas que as sustentavam, desabaram, caindo parte desse material para a rua e o resto para o interior do mesmo.
Aspecto quasi identico, senão mais vexatório, apresenta a rua 15 de Novembro.
Nessa via publica continua apoiado, em quadro frágeis escoras, um casebre antiquissimo, para o qual, já pedimos tambem, as vistas da Municipalidade.
Para comprovar a razão dos nossos commentários, tornamos a reproduzi-lo, afim de que o publico o assignale bem, precavendo-se ao passar pela 15 de Novembro.
Fica esse trabalho defronte da Assistência Publica e muito próximo da Intendencia.
Apedrejamentos
De diversos proprietários recebemos uma reclamação, referindo-nos que o molecório da cidade deu para se divertir com apedrejamentos, destruindo os vidros das janellas e bandeirolas de casas desoccupadas.
Os prejudicados queixam-se de taes abusos, declarando que pagam a famosa taxa de policiamento, sem o mínimo proveito.
Esses apedrejamentos verificam-se principalmente à tarde, quando a gurysada começa a juntar-se para os desatinos.
Bom seria que o capitão Agenor Barcellos Feio, commandante da Guarda Civil, tomasse em consideração essa queixa dos proprietários, recommendando aos seus subordinados um pouco de attenção para a sorte dos prédios desoccupados.
Talvez assim, diminuam os apedrejamentos.”
Autoria desconhecida.
Referências:
[1] Estado do Rio Grande, 16/01/1930, p. 7. Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional. A grafia original foi mantida.