"Um crime misterioso á rua Riachuelo"."Um crime misterioso à rua Riachuelo". Diário de Notícias, 21/06/1933, p. 5. Hemeroteca do Museu de Comunicação Social Hipólito José da Costa. Detallhe.

“Um crime misterioso á rua Riachuelo”

Não fosse a fotografia do local onde teria se passado o crime, talvez esse relato do quotidiano da pequena criminalidade da Porto Alegre de 1933 não teria tanto interesse. Porém, o “pardieiro infecto” onde se desenrolou o misterioso drama é um sobrevivente da Porto Alegre colonial portuguesa: um casarão típico com telhado de beiral, aberturas em arco abatido e um porão para adequar-se ao declive do terreno.

Na época da reportagem, Porto Alegre modernizava-se e ansiava por demolir estes resquícios do passado colonial de sua paisagem. Hoje, certamente seriam construções tombadas como patrimônio histórico.

“Um crime misterioso á rua Riachuelo[1]

Ás primeiras horas da noite de ontem, um conhecido larapio foi gravemente ferido

Segundo declarou ás autoridades, a vitima desconhece o seu agressor

Supõe-se, entretanto, que o gatuno tenha sido ferido por um seu colega, quando disputavam a posse de objetos furtados

O delegado Josino Brasil está, novamente, ás voltas com um caso rodeado de circunstancias misteriósas.

Ontem, ao anoitecer, o delegado do 1º distrito, de plantão á Chefatura de Policia, recebeu comunicação de que, á esquina das ruas Riachuelo e General Bento Martins, havia ocorrido um crime.

Localização atual do antigo casarão colonial no Google Maps.

Um homem fôra ferido gravemente e acabava de ser socorrido por um dos auto-ambulancias da Assistencia Publica.

Para o local

Imediatamente, o delegado, acompanhado por um de nossos companheiros de trabalho, que se achava na Chefatura de Policia, rumou para o local do crime, onde foi encontrar numeroso grupo de curiosos, que comentavam o sucedido.

Depois de ouvir as declarações do inspector Bacelar, da Guarda Civil, que fôra uma das primeiras pessôas que chegaram ao local do crime, o delegado iniciou as investigações para saber como o mesmo ocorrêra.

Um pardieiro infecto

Iniciando seu serviço, o delegado Josino Brasil penetrou no prédio existente á esquina onde se deu o crime, afim de ver se descobria algo que lhe pudesse fornecer uma pista segura, pois tivéra informações de que a vitima era um conhecido gatuno e que declarára não conhecer o autor dos ferimentos que recebêra.

A casa em questão é o célebre pardieiro para o qual o DIARIO DE NOTICIAS, já por diversas vezes, tem chamado atenção das autoridades competentes, por ser um verdadeiro deposito de imundícies. Além disso, o prédio em que ontem entrou o delegado do 1º distrito vem servindo, há muito, de abrigo a toda sorte de indivíduos, que o transformaram em albergue.

Uma faca e tres homens

No interior da celebre casa, a policia encontrou, além de grandes manchas de sangue, uma bainha de couro e uma pequena faca.

Todas as peças do prédio foram visitadas pelo delegado e seus auxiliares. Numa delas, foram encontrados tres indivíduos que dormiam a sono solto.

Eram os desocupados Aurelio Bastos, João Francisco Borges e Adão de tal, que foram transportados para a Chefatura de Policia.

"Um crime misterioso na rua Riachuelo" Diário de Notícias, 21/06/1933, p. 5. Hemeroteca do MCSJHC.
“Um crime misterioso na rua Riachuelo” Diário de Notícias, 21/06/1933, p. 5. Hemeroteca do MCSJHC.

Declarações do ferido

Depois de ouvir as declarações dos tres desocupados, que nada informaram sobre o crime, o delegado Josino Brasil dirigiu-se para a Santa Casa de Misericordia, para onde fora transportado o ferido, depois de medicado no Posto Central a Assistencia Publica, pelo dr. Loforte, doutorando Edgard Franco e Bier e enfermeiro Zacarias.

Ao ser interrogado pelas autoridades, o ferido declarou que transitava pela rua General Bento Martins, quando, foi abordado por um desconhecido, que, depois de lhe haver dirigido algumas palavras injuriosas, agrediu-o a faca, ferindo-o no rosto.

Declarou que não estivéra na casa existente á esquina da rua Riachuelo, o que parece não ser verdade, em vista das manchas de sangue que ali foram encontradas.

Quem é a vitima

A vitima do crime de ontem é o individuo João Pereira de Freitas, de 43 anos de idade, solteiro, residente á rua Baroneza de Gravataí n. 192.

Freitas é bastante conhecido das autoridades policiais, tendo saído há pouco da Colonia Correcional da Cachoeirinha, onde fora recolhido, por crime de furto.

Suas declarações são contraditórias e, segundo tudo faz crer, sabe perfeitamente quem o feriu.

O que supõe a policia

Tivemos oportunidade de ouvir o dr. Josino Brasil, sobre o fato.

Diz o delegado do primeiro distrito que não crê absolutamente, que Freitas não saiba quem o feriu.

Segundo supõe a referida autoridade, o gatuno foi ferido por um seu colega.

Estavam, provavelmente, repartindo o produto de algum roubo ou furto, quando surgiu uma desinteligência.

Como não se entendessem, os larapios, segundo se presume, empenharam-se em luta, tendo o contendor de Freitas feito uso de uma faca, ferindo-o”.

Autoria desconhecida.

Referências:

[1] “Um crime misterioso à rua Riachuelo”. Diário de Notícias, 21/06/1933, p. 5. Hemeroteca do Museu de Comunicação Social Hipólito José da Costa. A grafia original foi mantida.

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